Investigado na Operação Lava Jato por suposto recebimento de
“vantagens indevidas” da OAS e da Odebrecht, o ministro Vital do Rêgo continua
a conduzir processos de interesse das empreiteiras no Tribunal de Contas da
União (TCU).
Em ao menos cinco casos, que avaliam irregularidades em
contratos das empresas com a Petrobrás e outros órgãos públicos, Vital atua
como relator, com poder para determinar os rumos das auditorias e elaborar os
votos que orientam os julgamentos. A situação vem sendo questionada pelos
próprios auditores e procuradores da corte de contas.
O ministro responde a dois inquéritos no Supremo Tribunal
Federal (STF) por ter sido citado por empreiteiros e delatores da Lava Jato
como beneficiário de propinas quando exercia mandato de senador pelo PMDB da
Paraíba. Ele nega as acusações (mais informações ao lado).
Uma das investigações, aberta no ano passado, apura a
suspeita de que o então congressista cobrava “pedágio” de construtoras para
protegê-las na CPI Mista da Petrobrás, que ele presidia em 2014, antes de ser
indicado para a corte de contas. A acusação foi feita pelo ex-presidente da OAS
José Adelmário Pinheiro, o Léo Pinheiro.
Em depoimento, Léo Pinheiro disse ter pago, como
contrapartida, R$ 1,5 milhão em caixa 2 a Vital em sua campanha para o governo
da Paraíba, em 2014. O empresário entregou notas fiscais dos supostos repasses.
O ex-presidente da Andrade Gutierrez Otávio Marques de
Azevedo também disse ter tratado de pagamentos com Vital.
No mês passado, o relator da Lava Jato no Supremo, ministro
Edson Fachin, autorizou novo inquérito contra Vital, com base em depoimentos de
delatores da Odebrecht. Ele foi citado como um dos beneficiários de R$ 10
milhões em vantagens indevidas, supostamente solicitadas pelo ex-presidente da
Transpetro Sérgio Machado, que também fez acordo de colaboração. O ex-senador,
segundo o delator, recebeu R$ 350 mil.
Processos. No
TCU, Vital figura como relator de tomada de contas especial que apura
superfaturamento em contrato de US$ 825 milhões firmado entre a Petrobrás e a
Odebrecht em 2010, com o objetivo de executar serviços em refinarias e outras
unidades da estatal localizadas em nove países.
O ministro também é o responsável por outro processo, que
fiscaliza as obras de modernização e adequação da Refinaria do Vale da Paraíba
(Revap), em São José dos Campos (SP). A Odebrecht integrou o consórcio
responsável pelo empreendimento, de R$ 804 milhões. Os dois contratos são
citados na delação da empreiteira como objetos de corrupção.
Vital também é relator de outros três processos em que a OAS
é parte interessada. Eles apuram possíveis irregularidades em obras no
Aeroporto de Congonhas e trechos do Arco Metropolitano do Rio.
Embora figure como responsável por esses cinco casos, desde
setembro do ano passado o ministro já se declarou impedido, em plenário, em ao
menos outros três julgamentos de interesse da OAS. Esses casos não estavam sob
relatoria dele.
Para entidades que representam auditores e procuradores do
TCU, a situação do ministro denota conflito de interesses, uma vez que ele é
investigado por receber pagamentos ilegais de empreiteiras que ele está apto a
julgar. Advogados de cinco construtoras, entre elas a Andrade Gutierrez e a
Engevix, chegaram a arguir a suspeição e o impedimento de Vital numa auditoria
sobre o Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), com o argumento de
que sua imparcialidade estaria em xeque.
O plenário julgou o caso no mês passado e considerou as
alegações improcedentes, seguindo voto do relator, Aroldo Cedraz. Os ministros
acolheram os argumentos de Vital, entre eles o de que não fora levado aos autos
“qualquer elemento concreto capaz de demonstrar” seu interesse no julgamento do
caso, que não envolve OAS e Odebrecht. Cedraz é pai de Tiago Cedraz, advogado
investigado na Lava Jato.
Reações. Em nota
de dezembro do ano passado, a Associação Nacional do Ministério Público de
Contas (Ampcon) pediu que o ministro se afaste não só dos casos relacionados à
OAS e à Odebrecht, mas de todos os que dizem respeito à Petrobrás.
A Associação da Auditoria de Controle Externo do TCU
(AUD-TCU) também pediu que Vital e outros ministros investigados deixem de
julgar processos da Petrobrás, da Eletrobrás e das empreiteiras, até que os
inquéritos sejam concluídos.
A presidente da AUD-TCU, Lucieni Pereira, diz que os
ministros da corte atuam como juízes e têm as mesmas prerrogativas e
impedimentos dos integrantes do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Para ela,
também são aplicáveis a eles os preceitos éticos da magistratura, que impõem
conduta que contribua para “fundar a confiança” da sociedade nos julgamentos.
Defesa. O
ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Vital do Rêgo informou, em nota,
que 'cumpre as regras de impedimento, de acordo com as leis e o regimento da
corte'. Vital não respondeu sobre o eventual conflito de interesse ao relatar
casos relacionados à OAS e à Odebrecht. A reportagem pediu a relação dos
processos de interesse das empreiteiras nos quais tenha se declarado impedido,
mas não foi inviada.
Vital nega as acusações dos delatores da Lava Jato. Em nota
divulgada no mês passado, ele informou desconhecer os fatos narrados por
executivos da Odebrecht e repudiou as 'falsas acusações'. Disse também que
'nunca teve relação de proximidade com o ex-presidente da Transpetro Sérgio
Machado'.
Sobre as suspeitas de cobrança de 'pedágio' na CPI mista da
Petrobrás, sustentou, em nota, que 'jamais negociou, com quem quer que seja,
valores relacionados a doações ilícitas de campanhas eleitorais'.
News Paraíba
com Estadão