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Aplicativos com sede no exterior devem obedecer legislação brasileira, defende MPF

terça-feira, 17 de abril de 2018

/ por News Paraíba

Raquel Dodge ressalta que Marco Civil da Internet autoriza que Brasil requisite diretamente a empresas como o Facebook dados para auxiliar investigações

As empresas de aplicativos com servidores de internet sediados no exterior, como o Facebook e o Google, devem obedecer às leis brasileiras para fornecimento de dados, conforme determina o Marco Civil da Internet e o Código de Processo Civil. Qualquer restrição às autoridades nacionais para obter diretamente as informações coletadas por essas empresas vai gerar prejuízo às investigações em andamento, dificultando a apuração de crimes cibernéticos. É o que defende a Procuradoria-Geral da República (PGR) em parecer enviado ao Supremo Tribunal Federal (STF).

O tema será analisado pelos ministros na Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 51, proposta pela Federação das Associações das Empresas de Tecnologia da Informação (Assespro Nacional). A entidade questiona se a Justiça brasileira possuiria ou não jurisdição sobre as empresas estrangeiras que prestam serviços ou possuam filial no Brasil.

No documento enviado ao STF no último dia 2, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, defende a aplicação harmônica de leis nacionais e acordos de cooperação jurídica celebrados entre o Brasil e outros países, sem que isso represente inconstitucionalidade. Ao contrário, a incidência conjunta desses mecanismos é desejável e tem o objetivo de coibir a prática de delitos.

Para tornar eficaz o combate à criminalidade digital, argumenta Dodge, é preciso garantir às autoridades brasileiras o poder de acessar de forma célere as informações. Nesse sentido, o artigo 11 do Marco Civil da Internet é bastante claro, pois torna obrigatória a aplicação das leis pátrias em operações de coleta, armazenamento e tratamento de registros por provedores de internet ocorridas em território nacional.

No parecer, a procuradora-geral explica que, caso a prestação de informações por empresas estrangeiras fique condicionada ao sistema de cooperação internacional, questões legais específicas a determinados países podem simplesmente impedir a investigação de ofensas que são consideradas graves em outros. Um exemplo concreto seria a utilização do Facebook para a prática de crime eleitoral em território nacional, como injúria, calúnia ou difamação.

Nessa situação, um eventual pedido de cooperação para obtenção de conteúdo poderia ser negado pelas autoridades norte-americanas, com base na Primeira Emenda da Constituição estadunidense – que assegura a liberdade de expressão. Assim, a prova da infração não seria obtida porque autoridades estrangeiras, que não têm absolutamente nenhum interesse na causa, estariam impedidas de atender ao pedido de cooperação.

Fuga de jurisdição – Uma das principais dificuldades encontradas pelos órgãos de investigação é executar ordens judiciais contra grandes empresas de internet. Companhias como o WhatsApp alteram frequentemente o país onde estão localizados seus dados e frequentemente se recusam a fornecê-los sob o argumento de que não estariam sujeitas às leis brasileiras. Para tentar contornar esses entraves, as autoridades têm solicitado as informações diretamente às filiais no Brasil.

“A empresa controladora pode utilizar tecnologia que roteia os dados em diferentes servidores, em diferentes locais do mundo, armazená-los em alto-mar ou em locais que não atendem a requisições de autoridades estrangeiras”, destaca uma nota técnica assinada por membros do MPF integrantes do Grupo de Apoio ao Enfrentamento dos Crimes Cibernéticos, da Câmara Criminal do Ministério Público Federal (2CCR/MPF). Mais do que isso, a empresa pode alterar a sede de sua controladora a qualquer momento, eximindo-se de cumprir qualquer requisição legal.

Entenda o caso –  A ADC 51, que tem o  Facebook como amicus curiae (amigo da corte), pede que o STF reconheça a constitucionalidade dos seguintes dispositivos legais: Decreto Executivo Federal nº 3810/2001, que regulamenta o Acordo de Assistência Jurídica Penal (MLAT, da sigla em inglês) firmado entre Brasil e Estados Unidos; do artigo 237, II, do Código de Processo Civil; e dos artigos 780 e 783 do Código de Processo Penal.

A associação advoga que os provedores estabelecidos no exterior estariam sob a jurisdição do país onde está a sede controladora dos dados, e suas filiais brasileiras não poderiam ser responsabilizadas por descumprimento de ordens judiciais brasileiras. Alega ainda que o instrumento adequado para obtenção dos dados seria via procedimentos de cooperação internacional, no caso o MLAT, e mecanismos de cartas rogatórias, geralmente mais demorados.

Para a Procuradoria-Geral da República, o MLAT, aplicado de maneira isolada, não é eficiente para a produção de provas eletrônicas, pelo fato de ser moroso e sofrer limitações impostas pela legislação norte-americana. Levantamento feito pelo Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI), vinculado ao Ministério da Justiça, revelou que dos 108 pedidos de cooperação jurídica internacional feitos com base no acordo, apenas 18 tiveram as diligências atendidas. “A sociedade brasileira, que debateu amplamente o Marco Civil da Internet, não pode se ver submetida à conveniência de uma empresa ou ao entendimento dos legisladores de outros países”, sustentam os procuradores na nota técnica do MPF.

Reunião – No último dia 5, representantes da Assespro Nacional, Facebook e Yahoo estiveram reunidos com a coordenadora da Câmara Criminal do MPF, Luiza Frischeisen, a procuradora regional Neide Cardoso de Oliveira e a procuradora da República Fernanda Domingos, integrantes do Grupo de Apoio ao Enfrentamento dos Crimes Cibernéticos. Na ocasião, a coordenadora da 2CCR reiterou o posicionamento institucional contrário à ADC 51. “O que não pode haver é uma decisão judicial proferida no Brasil ter de ser submetida às autoridades dos Estados Unidos para ter eficácia”, resumiu.
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